Monday, October 09, 2006

NENHUMA DOR PELO DANO

O ser humano é vil. Doentio. Egoísta.
Ele não consegue me abandonar. Desapegar. Desapego é a coisa mais importante que aprendi na minha vida inteira. Mesmo sabendo que não existe jeito, que me faz mal, que não existe a mais ínfima chance de qualquer coisa, ele ainda quer me guardar naquela caixinha debaixo da cama como ele faz com todas as coisas que gosta. My precioussss. E ainda diz que isso é amor. Isso não é amor. O amor não deveria ser uma patologia. O amor deveria curar, não fazer sangrar nem matar nem fazer ninguém definhar.
Eu não sou sua.
Eu não sou de ninguém.
Eu sou do mundo, talvez.
Eu sou minha.
Uma vez eu escrevi num guardanapo de restaurante, no auge da paixão, no auge de tudo, quando achei que ia morrer com ele, um poema do Leminski que que só consegui entender plenamente hoje. Naquela época eu sabia de coração. Agora eu esqueci. Sei que dizia algo como "não te quero só pra mim/nem poderia/te quero pro mundo inteiro/ quanto mais for o que quiser/mais será o que eu queria". Não era assim. Era bonito. Isso está tosco e um poema do Leminski nunca é tosco. Mas era isso que dizia. Nenhum dos dois entendeu. Os dois se consumiram. O amor romântico morreu. Tudo morreu. A gente quase morreu. Sobrou, sei lá o que era aquilo. Um fogo morto que ainda queimava. E machucava. E eu não quero me queimar.

Eu quero paz.


Eu já fui vingativa, ciumenta, possessiva, insana. Fazia parte da minha doença. Mas hoje a minha doença está dentro do meu bolso, dentro de uma caixinha de remédios de 50mg que eu tomo religiosamente todos os dias. Porque eu não vejo graça nenhuma em ser doente. Eu quero ser sã. Eu não quero o mal de quem eu amo. E se a minha proximidade puder causar algum dano, por mais que me doa, por mais que me entristeça, eu vou me afastar. Porque agora eu entendo que sangrar nunca foi a solução.

Babe, por favor. Não me deseje o mal. Eu quero que você seja feliz. Eu não fui capaz de te dar a felicidade eterna, nós não vamos ficar velhinhos juntos na fazenda como achávamos, nós não vamos ter mais filhos, nós não vamos ter mais nada. Acabou. Então eu espero que você possa ter com outra pessoa. Porque isso eu não posso mais te dar. Não me odeie, não me deseje mal e não fique achando que eu fiz nada por vingança. As coisas acontecem. Você sabe. Me queira feliz também. E me deixa ir. Eu sei que dói. Mas me deixa ir.

Amor, então,
também acaba?
Não, que eu saiba.
O que eu sei
é que se transforma
numa matéria-prima
que a vida se encarrega
de transformar em raiva.
Ou em rima.
P.L.


 
 

TUDO TINHA MUDADO. Menos o que ficou igual.

  • Vida de gato
  • Das coisas esquecidas atrás da estante : esgotado, procure nos sebos!
  • Máquina de Pinball
senso*